No dia 1º de maio de 1919, a 1ª fábrica de automóveis da Ford chegava no Brasil, e, em 11 de janeiro de 2021, sua saída do país foi anunciada. Então, o que podemos analisar diante desta decisão histórica da Ford em relação aos aspectos tributários brasileiros e à forma de tributar do nosso país?
Estava pegando meu café, dando uma pausa entre um processo e outro, quando escutei um dos advogados do escritório dizer que havia lido um artigo dizendo que, com o anúncio de encerramento da produção de automóveis no Brasil, a Ford teria diretamente a demissão em massa de 5 mil funcionários.
Naquele momento, aquele número me impactou tanto, pois não são apenas 5 mil funcionários que estarão desempregados, serão 5 mil famílias, diretamente falando, que serão atingidas! Contudo, com o desenvolver do raciocínio sobre o caso na minha cabeça, me deparei com diversos “porquês” sobre as razões da deixada da Ford do país, e dois deles foram: benefícios fiscais e o sistema tributário complexo brasileiro. Sei que vários outros fatores foram levados em consideração pela montadora, porém não irei tratá-los neste artigo.
Acerca dos benefícios fiscais, se observarmos que o setor automotivo é um dos mais beneficiados no Brasil, em torno dos R$ 69 bilhões nos últimos 20 anos, conforme dados compilados à Receita Federal, diante dos zeros acumulados, devemos analisar os objetivos de tais benefícios e se os mesmos estão sendo atingidos.
Em breves palavras, a fomentação de crescimento de setores da economia, geração de empregos e atração de investimentos através da redução da carga tributária das empresas beneficiadas são, em resumo, os principais objetivos da criação dos benefícios tributários.
Dessa forma, eis que chego à pergunta: por que a concessão de facilidades para a Ford não a fez ficar? Será que os objetivos estão sendo atingidos? Pois bem, talvez para outros ramos a tática esteja dando certo, mas para a Ford, e para a Mercedez-Benz, que também encerrou sua produção no Brasil em dezembro do ano passado, não deu certo!
Costumam dizer que em time que está ganhando não se mexe; então, quando a tática do jogo está dando drasticamente errado, modifique a estratégia!
Primeiramente, os benefícios tributários concedidos pela União, estados, municípios e Distrito Federal geram uma larga redução nos cofres públicos; contudo, logo em seguida, o aumento da carga tributária para a população ou até outras áreas empresariais é visto. Conclusão: sistema desbalanceado de contrapeso. Mas, onde quero chegar com isso?
Em um país em que o salário-mínimo está na faixa dos R$1.100,00, o que é a realidade da grande maioria de brasileiros, e um carro popular custa em média R$40.000,00, temos que pensar que algo aí está errado!
Neste caso, inserem-se vários outros tributos neste preço, tais como: IPI, PIS, COFINS, etc. As montadoras elevam os valores para o consumidor para que elas tenham lucros, o que resulta na queda de vendas, pois a maioria da população não consegue arcar com os preços anunciados. Moral da história: para manter as montadoras no país, o Brasil estava concedendo vários benefícios fiscais para que elas permanecessem por aqui e que, no final de tudo, não foi o bastante para que isso ocorresse.
Utilizando o caso Ford como forma de aprendizado, não seria o momento adequado para que não só benefícios tributários proveitosos sejam dados, mas também seja colocada em prática a simplificação do sistema tributário em que as empresas não tenham altos gastos para que obrigações acessórias e controles sejam colocados em dia? Ou até ir ao encontro da sistemática tributária de países como Reino Unido, Alemanha e Estados Unidos que buscam tributar de maneira mais justa o ganho de renda, lucros e patrimônio do que o consumo em geral?
Está aí estampado, de maneira cada vez mais gritante, o momento de rever a forma de tributação brasileira, utilizando a reforma tributária como uma das melhores saídas dos últimos tempos para que haja a retomada na economia e na melhora da qualidade de vida dos cidadãos. Simplificar e dosar as necessidades dos contribuintes e do Estado é primordial, utilizando casos de grande repercussão, como a saída da Ford do Brasil, para coletar e sistematizar informações sobre as necessidades no âmbito tributário que o Brasil carece.
Fiquemos atentos aos próximos capítulos sobre a reforma tributária, aguardando ansiosamente para que mudanças para melhor sejam efetuadas. Por fim, que o nosso país possa aprender com os erros e utilizá-los ao nosso favor.
Avante, Brasil!
Escrito por:
Nayara Abdala, advogada, atuante na área de Direito Tributário, no escritório Raul Bergesch Advogados. Nayara está no Instagram como @nayaraabdala.adv.